Anos de fracassos e possibilidade do rebaixamento fortalecem torcida do SP
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De Vitor Birner
A quarta força na década
Conquistas podem aumentar o numero de torcedores, mas são as temporadas de sofrimento que intensificam o amor pelas grandes agremiações.
O São Paulo vive uma década de fracassos. Tomou goleadas em clássicos, foi eliminado por times grandes, médios e pequenos no mata-mata, e quase nada comemorou.
O único troféu que ganhou foi a Copa Sul-Americana. Disputou 4 Libertadores e foi uma vez à semifinal, encerrou uma edição do campeonato brasileiro na segunda colocação, o que é pouco para quem formou gerações acostumadas com títulos e elencos fortes.
Nas últimas edições dos pontos corridos apresentou a zona do rebaixamento aos torcedores.
Nessa mesma década o Corinthians ganhou todos os torneios mais importantes; o Palmeiras foi à segundona, mas comemorou Copas do Brasil e é o atual campeão nacional; o Santos ganhou o mata mata nacional e a Libertadores. Os oponentes no estado festejaram enquanto a torcida do São Paulo acumulou frustrações e raiva com o futebol.
Ponto para a arquibancada
Por isso compareceu no Morumbi em grande número, quebrou recordes de público diante de Coritiba, Grêmio e Cruzeiro, e provavelmente manterá a média na próxima atuação do time no estádio. .
Mais importante que a quantidade é barulho no apoio aos que vestem a camisa dentro do gramado. Quanto maior foi a dificuldade em campo, proporcionalmente subiu o som na arquibancada.
A certeza que o time de Renato era melhor, tal qual o andamento mostrou, aumentou o impulso de jogar com o time e a urgência de ajudá-lo a somar pontos incendiaram a arquibancada. Sem o povo o São Paulo dificilmente conseguiria o empate.
O torcedor adquiriu todos os ingressos e contribuiu para ganhar do Cruzeiro no Morumbi.
Curiosamente, diante do Coritiba, no único desses jogos em que a agremiação foi a melhor em campo e recebeu o apoio mais intenso da arquibancada, houve o tropeço em frente aos mais de 50 mil.
Torcida não ganha jogo, mas pode ajudar ou, se comparecer em grande número e reclamar ao invés de fortalecer, atrapalhar na conquista do resultado positivo. O estádio tem recebido grande público porque o sofrimento acumulado de quem ama o clube e o ingresso com preços populares 'levam' o povo de todas as classes sociais ao tradicional e mítico reduto do futebol.
O positivo e indesejado bônus
Poderia citar outros clubes, mas os dois maiores oponentes do São Paulo na capital servem para comprovar a teoria que o sofrimento potencializa o apego pela agremiação.
A conquista mais emocionante do Corinthians foi o Paulistão de 77. O Estadual tinha, na época, grande relevância no cenário nacional. A sabedoria recomenda esquecer a ideia de compará-lo com o atual e afirma que foram os quase 23 anos de jejum que tornaram o êxito tão grande.
Brasileirão, Mundial e a Libertadores são maiores. Nenhum desses gerou uma festa como a aquela nas ruas da cidade e no Morumbi.
A geração que vivenciou a maior escassez de títulos foi uma das mais fieis de qualquer clube no país.
O Palmeiras, durante o jejum do Alvinegro, era o único a rivalizar em campo com o Santos de Pelé. Ganhou a alcunha de Academia do Futebol. Manteve o refinamento nos gramados com a 'Segunda Academia' nos anos 70 e encantou os torcedores.
As conquistas dos oponentes e os rebaixamentos alteraram o perfil da nação palestrina. Teimou no inicio, a turma do amendoim exigia toque de bola como o que assistiu nos tempos de Ademir da Guia ou do elenco orientado por Vanderlei Luxemburgo na era Parmalat, mas a necessidade gerou apoio para aquele guerreiro e elogiável time de Felipão na Libertadores.
As duas participações na segundona lapidaram mais o amor pelo clube. A condição de coadjuvante ou a de apenas competir para continuar na elite mexeram com a alma da arquibancada. Na campanha em que foi eliminado da Libertadores com o equívoco de Bruno no Pacaembu, o barulho e a participação foram enormes. Talvez os mais intensos da década nos estádio de São Paulo. .
O óbvio lembrete
A atual geração de torcedores do Corinthians, que se habituou a ganhar, apoia e fortalece o time, mas menos que aquela do jejum de conquistas.
Normal. Assiste ao clube mais ganhador na década. Tem apenas vaga ideia do que é uma enorme sequência de frustrações.
O Palmeiras, se continuar investindo e conquistando torneios, terá uma alteração de perfil da arquibancada no Allianz Parque, que tende a ser mais exigente e menos participativa.
Pouco para as comparações
''Tenho Libertadores, não alugo o estádio, sou hexa brasileiro, nunca fui rebaixado''.
O canto ecoa na arquibancada do Morumbi e transborda o orgulho da torcida pela agremiação de tantas proezas nos gramados. É impossível comparar as fases negativas de Palmeiras e Corinthians com as do São Paulo. Foram pequenas as do clube que hoje se assusta com a possibilidade da segundona.
Além disso, o time ganhou de gigantes nos Mundiais.
Foi melhor diante do batizado 'dream team' do Barcelona.
Em duas conquistas de Libertadores – as primeiras – jogou futebol arte que, desde então, continua inigualável no continente.
Esses últimos anos tropeçando, ganhando apenas a Copa Sul-Americana e 'apenas' conhecendo a possibilidade do rebaixamento, são pouco diante do que houve com Palmeiras e Corinthians.
Por isso a torcida no Morumbi tende, quando houver melhor em campo, a diminuir a intensidade. O hábito humano de querer sempre mais e se acostumar facilmente com o topo dita o que acontece nas arquibancadas do país.
Mas, dependendo do que houver no torneio de pontos corridos, pode ser líder na média de público e agregar essa 'conquista' da arquibancada.
Obs: o maior jejum do agremiação foi de 12 temporadas, mas noutro contexto, pois construía o Morumbi.