Fifa deveria retirar o Mundial da Rússia; é melhor para o futebol
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De Vitor Birner
A realização do Mundial na Rússia é mais uma daquelas opções que fazem a gente compreender a Fifa. Foi decidida na gestão de Blatter e Valcke, atualmente impossibilitados de continuarem à frente da entidade, investigados pelo FBI.
Havia motivos aos montes para a escolha de outra sede. Concorreram as candidaturas conjuntas de Holanda/Bélgica e Portugal/Espanha, além da Inglaterra, todas nações mais democráticas, a maioria com plena cultura de futebol.
No 'segundo turno', o país que saiu da União Européia foi derrotado pelo que deveria ser a última opção entre os postulantes.
Mas é simples saber o que motivou os cartolas.
Além da suspeita de compra de votos que os norte-americanos querem comprovar desde o governo de Obama (aguardo para saber se haverá alguma alteração de rumo, acho que será mantido, após a saída do líder e a eleição do radical nacionalista), a nação ganhadora atende aos requisitos que pautaram a escolha anterior e que deveriam convencer os cartolas a optarem por outros candidatos.
Azarão pela ética
Países dispostos a investirem a maior verba possível em arenas, ou seja, os menos estruturados para a recepção do torneio, têm maior possibilidade para ganhar a eleição.
A falta de mecanismos de fiscalização dos governos, que facilita o superfaturamento de obras e o pagamento de propinas, deveria ser alicerce da opção que faz a entidade, mas houve menosprezo dessa referência que contribuiria para a credibilidade dos que gerem o futebol.
Os russos, segundo o último relatório da Transparência Internacional, são os 131° no ranking da honestidade. Empatam com os ucranianos e têm o pior índice das nações na Europa.
O Brasil está 52 colocações acima no ranking dos mais éticos
Ou seja, o pior é melhor, desde que tenha grana. seja fácil movimentá-la, haja pouca fiscalização prática e muito diálogo dos políticos com os cartolas.
As prioridades para a sociedade, tal qual os crentes no legado e os críticos da política nacional perceberam tardiamente no Brasil, foram secundárias e menosprezadas pelos dirigentes na eleição..
Os líderes em honestidade são a Dinamarca e a Nova Zelândia que somam 90 pontos dos 100 possíveis para a medição. A Holanda (8°) conseguiu 83, a Bélgica (15°) 77, Portugal (29°) 62, Espanha (41°) 58 e o Reino Unido* (10°) tem 81.
A pontuação do Brasil é 40 e a da Rússia apenas 29. A Venezuela é a única da América do Sul com classificaçãom pior que a do país sede do torneio.
A Fifa que mina o esporte
O Mundial é o torneio de confraternização. Foi, outrora, o choque de escolas e de excelência técnica do esporte. Ninguém sabia o que havia nos gramados doutros países.
A competição apresentava os jogadores para o planeta nada globalizado e misterioso no futebol
Isso acabou. Há clubes mais fortes que qualquer seleção, temos acesso aos jogos para conhecermos os atletas, e houve a mistura de propostas de futebol. .
A confraternização e o convívio de torcedores provenientes de culturas distintas são o que há de mais rico no atual momento do torneio.
A Rússia caminha na contramão. O governo populista, nacionalista, apoia a legislação que agride a urgente necessidade da harmonia coletiva.
O presidente, nesse ano, assinou a lei que abranda punições aos que cometerem violência doméstica. Apenas quem forçar a esposa a ser hospitalizada ou for reincidente pode ser condenado a algo além de multa.
Os homossexuais são mais um grupo que necessita conviver com os preconceitos de Estado.
O Ministério da Saúde propôs, ano passado, regulamentar a especialização no diagnóstico da ‘desordem de identidade de gênero e preferência sexual', e o tratamento do que avalia como patologia. Acha que há merecedores de internação compulsória.
Divulgação o que chamam de propaganda gay’, e apoio de heterossexuais aos direitos de quem tem outra preferência sexual são proibidos.
Filmes que falam de política, de acordo com o viés, podem ser censurados, os memes com as figuras de chefes de estados são vetados, e há outras restrições ao direito de opinar e contrapor o establishment.
Mas o racismo 'pode' ser cultuado
Brian Idowu, zagueiro nigeriano. afirmou ao sair do clube que sofreu por isso nas categorias de base. Foi avisado que não subiria ao time principal por ser negro, e como os gays é rejeitado.
A direção do time negou.
Quatro anos atrás, houve o manifesto de uma torcida do Zenit São Petersburgo, no qual mostrou orgulho de o clube grande nunca ter atuado com afrodescendentes ou homossexuais. Hulk e o belga Axel Witsel foram contratados dois meses antes do manifesto e provavelmente motivaram o mesmo de conteúdo do mais puro fascismo:
Leia a carta que divulgaram
''Nós não somos racistas, mas a ausência de jogadores negros na escalação do Zenit é uma importante tradição que enfatiza a identidade do clube e nada mais.
Nós como o clube mais setentrional das grandes cidades europeias nunca compartilhamos a mentalidade da África, América do Sul, Austrália ou Oceania. Nós apenas queremos jogadores de outras nações eslavas, como Ucrânia e Belarus, assim como dos países bálticos e Escandinávia. Temos a mesma mentalidade e histôrico e cultura como estas nações.
Grande parte desses campeonatos é jogada em climas duros. Nessas condições, às vezes é difícil para os jogadores técnicos de países quentes exibirem seus talentos no futebol de forma completa. Queremos jogadores mais próximos da nossa alma e mentalidade para jogar pelo Zenit. E somos contra a inclusão de representantes das minorias sexuais no time''.
Eis uma reportagem da BBC quando o Liverpool foi atuar diante do clube.
O lucro em detrimento da educação
A realização do torneio na Rússia facilita a propaganda política de governantes. Talvez mostre ao planeta as edições com o que há de positivo no país, e esconda manifestações de preconceito. Essa tática é antiga e parece continuar na moda.
Foi usada pela URSS e EUA na guerra fria, e por nazistas, todos promovendo as Olimpíadas. A ditadura 'hermana' sediou o Mundial e conquistou o torneio.
O ideal seria os cartolas da Fifa perguntarem, a si próprios, para quê serve o futebol, além de oferecer lucros políticos e econômicos à entidade e gestores.
Utopia porque seres humanos preferem
Sei que o Brasil é racista, conservador, homofóbico, machista e provinciano no debate que ensina o convívio.
Isso tem a ver com a cultura e a educação, e será encerrado quando as pessoas entenderem que têm o direito de não gostar e a obrigação de respeitar. Institucionalmente, a legislação é retrógrada em muitos pontos, mas preserva direitos que a Rússia restringe.
Solidariedade, indulgência, caridade e perdão alicerçam a harmonia coletiva, nascem dos indivíduos e o Estado tem que fomentar tais virtudes agregadores, positivas e construtivas. .
Os vetos ao culto do ódio e inclusão dos direitos são relevantes para abrandar as mazelas que dificultam os avanços da sociedade.
O ideal seria vivermos no planeta de amor, honestidade, e nenhuma lei; do egoísmo extinto, e de plena paz a todas as espécies da natureza.
Enquanto mantivermos o antropocentrismo, origem do egoísmo, corrupção e de tudo que torna a existência uma guerra de conquistas tão épicas quanto primitivas, a sociedade continuará empacada ou terá minúsculo caminhar à frente fantasiado de grande avanço para o coletivo.