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Brasil teve sucesso no futebol das moças; reverencio todas as desbravadoras

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De Vitor Birner

O Brasil poderia ter melhor colocação no torneio olímpico. Os equívocos nas finalizações diante de Austrália quase impediram, e contra a Suécia fizeram isso. Na série alternada dos pênaltis ganhou das 'Matildas' e tropeçou contra as nórdicas.

No futebol isso tanto faz. O único mérito esportivo de quem possui mais qualidade é ter maior possibilidade para conseguir os resultados positivos. Norte-americanas jogam mais que as suecas e foram eliminadas.

As finalistas são a quinta força do futebol feminino atrás dos EUA, Alemanha, Canadá e Brasil, nessa edição dos jogos.

Por conhecerem os próprios limites e serem inteligentes na proposta de futebol conseguiram o privilégio de tentar o ouro.

Poderia ser mais

O padrão de futebol da seleção piorou na disputa pelo bronze.  O Canadá mereceu a medalha.  Se impôs com sobras, apesar de o resultado não mostrar.

Foi superior na parte coletiva ao manter o sistema de marcação adiantado na maior parte do jogo e impedir o Brasil de fazer a transição de bola à frente, na técnica ao executar os lances, e na física porque Marta e cia tiveram que correr mais para taparem lacunas geradas pelas dificuldades táticas e no toque de bola.

Acertou duas vezes as traves, fez o mesmo número de gols na Arena em Itaquera e, com mais capricho, sequer permitiria o esboço de reação após o gol de Beatriz fazendo o pivô preciso após o cruzamento em cobrança de lateral.

Contra quase tudo e todos

A torcida de milhões pelo futebol das moças será interrompida.  Durou duas semanas.

Talvez no Mundial da França, em 2019, se conseguirem a classificação, ganhem de novo o apoio. O mesmo vale para os Jogos de Tóquio no ano seguinte.

A cartolagem da CBF provavelmente 'manterá nos cofres da entidade' os milhões de reais arrecadados pela seleção masculina, em vez de investir no fomento da modalidade feminina. Promover torneios de clubes, aceitar o prejuízo econômico enquanto o esporte cai nas graças de mais gente e constrói mercado consistente é fundamental e pouco provável.

As mulheres que sonham em ser atletas devem ter a perspectiva de sobreviverem com salários ganhos no esporte.

Apenas as exceções conseguem. Os paliativos tais quais a seleção permanente e a Copa do Brasil são migalhas. Ninguém, racionalmente, ao observar as ofertas nessa área escolhe investir na carreira de jogadora de futebol.

As idealistas e as que não têm outra concretas opções, quando amam jogar bola, tentam e conseguem ultrapassar os enormes bloqueios gerados diariamente pelo monte de circunstâncias sociais e de gestão.

São poucas diante da quantidade que curte a atividade. Ganhar a medalha de ouro era, na prática, muito menos difícil que alterar isso no país de monocultura esportiva.  Torcer durante as Olimpíadas é simples.

Todas as modalidades com potencial para agregarem números ao quadro do COI a população apoia.

Política tradicional para manutenção de poder     

Qualquer balela que desperte o lado piegas do patriotismo é comprada por parte da população. Inclusive a que agora se transformou em moda sazonal, a tal do Brasil olímpico, apesar da as escolas públicas não terem quadras e muitas vezes sequer merenda.

O futebol feminino pode ser ferramenta de populismo barato. Quem afirma que ama a nação e sabe quais são as maiores necessidades, prioriza o esporte para a educação acima dos resultados em torneios.

Da quantidade se extrai qualidade. Os centros de excelência, há alguns no país e nem todos com estrutura, que aprimoram os principais atletas do esporte são o fim do ciclo do desenvolvimento de possíveis ganhadores.

O início, a base do fomento ao esporte no país, é praticamente nula e aleatória. Em meio as quase duas centenas de milhões de habitantes, surgem os malucos dispostos a contrariarem tudo, e desses os com talento acima da média esporadicamente obtêm êxito e medalhas.

Fundamental: iniciativas de indivíduos, dos cidadãos que têm projetos sociais nos quais incluem a prática esportiva, devem ser elogiados. Fazem o que caberia ao governo e posteriormente às federações das modalidades.

Muito além dos gestores

Aplaudo todas as brasileiras que jogam futebol, inclusive as amadoras que nunca tentaram o dificílimo feito de sobreviverem do esporte.

No país dos preconceitos, são criticadas se preferem a bola em vez de boneca – os maniqueístas devem lembrar que é possível gostar de ambas ou de nenhuma -, e quando conseguem gerenciar isso e se tornarem atletas, são apoiadas especificamente nos grandes torneios.

Apenas com muita coragem e amor pelo que fazem isso é possível. São desbravadoras das fronteiras do machismo, misoginia e doutras mazelas. Contribuem para a construção da harmonia coletiva indispensável na sociedade.

Diante de tantas barreiras que tiraram da frente e as que ainda têm, a quarta posição olímpica é feito, não fracasso, mesmo sabendo que com pouco de sorte e acertos nas finalizações obteriam resultado mais positivo.